8 de junho de 2018
Entrevista: Manoela Quintas fala sobre as inovações no Registro Civil
Neste sábado, 9 de junho, Anoreg-CE, Sinoredi-CE e IRTDPJ-CE promovem uma palestra sobre as inovações no Registro Civil. Para apresentar o tema e debater as mudanças na legislação e na rotina dos cartórios, o evento contará com a fala da titular do 1º Ofício de Registro Civil das Pessoas Naturais, Tabelionato de Notas e Anexos de Icó, Manoela Quintas.
Manoela Quintas é mestre em Direito Privado pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), onde foi professora de Direito Civil, e nessa entrevista fala não apenas das alterações legais como também salienta a importância do papel dos cartórios nas mudanças sociais. “Destaco um avanço que se encontra implícito nessas inovações que é o reconhecimento do Registro Civil como a peça chave desse processo evolutivo. Todas essas alterações que citei trazem a facilidade de serem formalizadas diretamente nos Cartórios de Registro Civil sem a necessidade de acionar a Justiça”.
Confira a entrevista na íntegra.
Anoreg-CE/Sinoredi-CE: Da série de inovações no Registro Civil de Pessoas Naturais, quais você destaca como as mais avançadas?
Manoela Quintas: A sociedade vem passando por várias mudanças e avanços, tanto tecnológicos como culturais. No âmbito da Família ocorreram mudanças na sua função, na sua natureza e na sua concepção e todas essas mudanças representam inovações que estão diretamente ligadas ao Registro Civil das Pessoas Naturais, uma vez que este acompanha o indivíduo, formalizando e dando publicidade, autenticidade e segurança aos acontecimentos da sua vida desde seu nascimento até sua morte. A família, como bem exemplifica o Jurista Paulo Lôbo, sofreu uma mudança de paradigmas, tem como função a afetividade, ou seja, “enquanto houver affectio haverá família, unida por laços de liberdade e responsabilidade” e é desta nova visão de família, fundada com base nos preceitos constitucionais que emanam as inovações que eu destacaria mais avançadas, como por exemplo reconhecimento da filiação socioafetiva, a possibilidade de alteração de nome e gênero para os transexuais e o casamento homoafetivo, que foi um divisor de águas após a resolução 175/2013 do CNJ. No entanto, destaco um avanço que se encontra implícito nessas inovações que é o reconhecimento do Registro Civil como a peça chave desse processo evolutivo. Todas essas alterações que citei trazem a facilidade de serem formalizadas diretamente nos Cartórios de Registro Civil sem a necessidade de acionar a Justiça. Percebeu-se a importância dos Cartórios de Registro Civil na desburocratização e na desjudicialização, trazendo agilidade e praticidade para os cidadãos que enfrentam ainda situações de preconceito, ao mesmo tempo em que são revestidas de toda segurança. Ainda há muitas inovações por vir, atualmente se fala em união poliafetiva, em várias espécies de gêneros etc. Surgirão muitas outras inovações, que o Registro Civil represente esse avanço facilitando a vida das pessoas.
Anoreg-CE/Sinoredi-CE: Do ponto de vista técnico, o que você acha que deve chamar atenção do registrador na atualização dos seus procedimentos?
Manoela Quintas: O registrador deve estar atento a esta nova visão da família pelo direito, deve estar atento às formas de tratamento e ao atendimento livre de estereótipos e preconceitos, baseado nos preceitos constitucionais de igualdade e dignidade da pessoa humana. Deve estar atento à legislação e aos procedimentos, pois estão sendo modificados de forma muito rápida e o registrador assume nesse novo contexto uma carga ainda maior de cuidados e responsabilidades.
Anoreg-CE/Sinoredi-CE: Você tem algum exemplo de como era antes e como passa a ser agora? Algo para destacar em um comparativo de questões muito afeitas à rotina das serventias e que tenham tido mudanças mais profundas?
Manoela Quintas: Essas alterações chegam muito rápido e afetam o dia a dia do Registro Civil, quando me refiro a esta nova visão de família e ao tratamento, estou falando no cuidado ao prestar o serviço de forma adequada, como exemplo cito algo simples da rotina dos cartórios que é a abertura de firma, no cartão de autógrafos não deve mais conter nome de pai e mãe e sim filiação, pois a pessoa pode ter dois pais ou duas mães. Esse é um exemplo que demonstra uma mudança mais profunda: a preocupação do Registrador em estar sempre adequando o seu serviço a todas essas inovações, que atualmente estão ocorrendo numa velocidade maior. Os avanços tecnológicos também afetaram muito a rotina do Registro Civil, as comunicações hoje são feitas pela internet e recebidas no mesmo dia, sem custos adicionais ao cartorário e a possibilidade de emissão de certidão de outro município sem que o cidadão precise se deslocar.
Anoreg-CE/Sinoredi-CE: Como você vê as mudanças na legislação específica para os cartórios tendo em perspectiva a evolução do Direito Constitucional e Civil brasileiros?
Manoela Quintas: Como os demais ramos do Direito, a legislação registral e notarial também está pautada nos princípios constitucionais de dignidade da pessoa humana, solidariedade, igualdade, liberdade, afetividade, melhor interesse da criança e proteção ao idoso, seguindo, seja na sua aplicação ou na sua interpretação, os novos valores e tendências que se formaram a partir da Constituição. Ainda encontramos na Lei de Registros Públicos alguns dispositivos já superados, por exemplo, artigos que diferenciam filhos em legítimos e ilegítimos, hoje inconstitucionais, mas a legislação registral tem avançado nos últimos anos para acompanhar as transformações sociais revolucionárias trazidas pela Constituição de 1988.
Anoreg-CE/Sinoredi-CE: O outro lado dessa série de inovações é o que é visto e sentido pela sociedade, por quem se utiliza os serviços dos cartórios. Nesse sentido, como você avalia o impacto das mudanças para a sociedade? Na sua atuação como registradora, tem algum caso que você recorde?
Manoela Quintas: Recentemente concluí um procedimento de averbação de alteração de nome e gênero e pude avaliar a importância do registrador civil nesse processo. Pude perceber que a alteração possibilitou que a pessoa possa viver melhor, de forma digna. A felicidade dela ao me relatar que agora seria mais fácil conseguir um emprego, que acabaria o constrangimento em diversas situações, foi muito gratificante. A felicidade de um filho ter reconhecida sua filiação socioafetiva é um outro exemplo do impacto do Registro Civil nessas mudanças e repito, de forma ágil, rápida, fácil, mas acima de tudo segura.
Anoreg-CE/Sinoredi-CE: Por fim, qual o papel que você acredita que os cartórios devem desempenhar diante das mudanças da sociedade contemporânea?
Manoela Quintas: Prestar um serviço cada vez melhor. Um serviço de excelência. O Registrador deve estar sempre atualizado e preparado para desempenhar esta função tão importante que é dar forma a todas essas inovações. Deve prestar um atendimento de qualidade, um serviço que atenda aos anseios sociais e que cumpram os objetivos e princípios constitucionais, respeitando cada vez mais a dignidade da pessoa humana. Costumo dizer que o Registrador e o Notário são o instrumento vivo do Ordenamento Civil e gosto muito das palavras de Joaquim de Oliveira Machado quando se refere ao cartorário dizendo que “escrevendo o instrumento com toda individuação e pureza…exerce benéfico influxo nos destinos dos povos.”
SERVIÇO:
Palestra: Inovações no Registro Civil
Data: 09/06, às 9h
Local: R. Walter Bezerra de Sá, 55 – Dionísio Torres, Fortaleza