19 de março de 2007

Jurisprudência – Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro

EMENTA

DIREITO CIVIL. DOAÇÃO INOFICIOSA. NULA É A DOAÇÃO DA PARTE QUE EXCEDER A QUE O DOADOR, NO MOMENTO DA LIBERALIDADE, PODERIA DISPOR EM TESTAMENTO – ARTIGO 1576, 1721 E 1790, § ÚNICO, DO CÓDIGO CIVIL/1916. CORRETA A DECISÃO QUE REDUZIU A DOÇÃO A ¼ DA TOTALIDADE DO IMÓVEL, CONFORME DISPOSITIVOS LEGAIS REFERIDOS. 1 – NA ESCRITURA PÚBLICA, O DE CUJUS PRETENDEU MESMO DOAR O IMÓVEL AOS RÉUS, PORÉM, A DOAÇÃO FERIU O DIREITO À LEGÍTIMIA DOS DEMAIS HERDEIROS. 2- MAS, TENDO O FALECIDO O DIREITO DE DOAR A METADE DISPONÍVEL DE SEUS BENS, NÃO DEVE O ATO SER ANULADO QUANTO ESTA PARTE, POR FORÇA DO ARTIGO 103 DO CC/1916, EIS QUE NÃO HOUVE LESÃO A TERCEIRO E NEM A DISPOSITIVO DE LEI. NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO. (TJRJ – 5ª Câm. Cível – ACi nº 2005.001.52773-RJ – Rel. Des. Antonio Saldanha Palheiro – julgado em 14.02.2006)

ACÓRDÃO

VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Apelação n.° 2005.001.52773, originários da 5ª Vara Órfãos e Sucessões da Comarca da Capital, em que é apelante Gabriel Kehdi Barros Araújo e são apelados Teresa Cristina Barros Araújo Arnold e outros.

ACORDAM os Desembargadores que compõem a Quinta Câmara Cível do Tribunal de Justiça, por unanimidade de seus votos, em negar provimento ao recurso.

VOTO

O autor ajuizou ação declaratória visando obter a anulação parcial de escritura de doação passada pelo Sr. Austriclinio Barros de Araújo, falecido em 20/03/89, tendo em vista ser este seu pai e ter doado aos demais filhos a parcela de 50% que detinha do imóvel descrito na exordial.

Alega que a doação da meação perpetrada pelo seu finado pai sobre o único bem que possuía deixou de contemplá-lo que, igualmente, era filho nascido do segundo casamento.

A magistrada julgou improcedente o pedido de declaração da fração de 1/8 do imóvel como pretendido pelo autor, e parcialmente procedente a anulação da escritura para reduzir a liberalidade da doação à fração de ¼.

Apela o autor, pretendendo a reforma da sentença para que seja reconhecido o seu direito a 1/8 do imóvel, bem como a condenação dos réus a trazer à colação a cota que já receberam.

Sem razão o apelante.

A sentença monocrátlca deu à demanda a melhor solução que se lhe impunha na delimitação do fato controvertido, devendo ser mantida em sua integralidade.

Como bem ressaltado, os fatos se passaram sob o regime do Código Civil de 1916, que é, então, o diploma regente da matéria.

A matéria a ser apreciada neste recurso refere-se tão somente à fração ideal do imóvel objeto da doação, uma vez que os réus reconhecem que a doação foi inoficiosa.

A Inoficiosidade da doação diz respeito ao fato de não ter o doador respeitado a legítima, uma vez que havia herdeiros. Assim, de acordo com o artigo 1576 do CC/1916, havendo herdeiros necessários, o testador só poderá dispor da metade da herança.

E, ainda, dispõe o artigo 1176 do CC;1916: “Nula é também a doação quanto à parte que exceder a de que o doador, no momento da liberalidade poderia dispor em testamento”. O texto é ratificado no artigo 1790, parágrafo único, apontando que se considera inoficiosa a parte da doação que exceder a legítima e mais a metade disponível.

Da simples, leitura dos dispositivos legais, supracitados, conclui-se correta a sentença que determinou a redução da doação par ¼ da totalidade do imóvel, uma vez que a liberalidade só poderia ir até o limite da sua parte disponível, devendo o restante ser levado a inventário, para a devida partilha do bem entre os quatro filhos do autor da herança.

Descabe o pedido do apelante no sentido de ver declarada sua propriedade sobre a fração ideal de 1/8 do imóvel, uma vez que a transgressão aos citados dispositivos não alcança toda doação, que gera efeito somente quanto a parte que exceder à de que o doador poderia livremente dispor, até o montante do disponível, restando válida a parte de que podia dispor livremente.

Ademais, o de cujus pretendeu mesmo doar o imóvel aos réus através da escritura pública lavrada no 6° Oficio de Notas desta cidade – fls. 10. Tendo o falecido o direito de doar a metade disponível de seus bens, não deve o ato ser anulado nesta parte, por força do artigo 103 do CC/1916, eis que não houve lesão a terceiro e nem a dispositivo de lei.

Em conseqüência, merece ainda ser afastado o pedido de que seja levado à colação a cota que os réus receberam, equivalente à fração de ¼ do imóvel, uma vez que mantida a doação nesta parte.

Diante do exposto, voto no sentido de negar provimento ao recurso.

Rio de Janeiro, 14 de fevereiro de 2005

DES. ROBERTO VADER – Presidente (sem voto)

DES. ANTONIO SALDANHA PALHEIRO – Relator